Baruch Spinoza foi um filósofo nascido em Amsterdã, de família judia de origem portuguesa, e foi um dos pensadores mais originais de sua época. Spinoza (1632-1677) foi excomungado da comunidade onde nasceu em 1656, o que significou uma emancipação intelectual e possibilitou que ele escrevesse os seus livros.
Spinoza realizou uma interpretação crítica da Bíblia. Sua teoria sobre Deus identifica-o com as leis da natureza científicas fundamentais, que explicam todos os fenômenos que ocorrem na natureza. A concepção de Deus de Spinoza exclui qualquer possibilidade de milagres ou interferência divina na ordem das coisas, o que Spinoza considerava superstição.
A crítica da superstição levou Spinoza a escrever a Ética, em que demonstra como Deus é a causa racional produtora e conservadora de todas as coisas. Por causa dessas críticas, Spinoza foi considerado um ateu, o que, naquela época, referia-se ao pior dos subversivos, aquele homem que concebia Deus contra a concepção tradicional e, portanto, abalava a aliança entre religião e Estado que sustentava o poder.
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Tópicos deste artigo
- 1 - Resumo sobre Baruch Spinoza
- 2 - Quem foi Baruch Spinoza?
- 3 - Em que Spinoza acreditava?
- 4 - Teorias de Spinoza
- 5 - Obras de Spinoza
- 6 - Teoria de Deus segundo Spinoza
- 7 - Religião de Spinoza
- 8 - Frases de Spinoza
- 9 - Exercícios resolvidos sobre Baruch Spinoza
Resumo sobre Baruch Spinoza
- Baruch Spinoza (1632-1677) foi um filósofo judeu-holandês, talvez um dos pensadores mais originais de sua época, tendo sofrido influência das filosofias escolástica, renascentista e cartesiana.
- Foi expulso da comunidade judaica de Amsterdã por expressar publicamente dúvidas acerca dos dogmas da tradição judaica.
- Spinoza defendia a subordinação do poder religioso ao poder civil, assim como a liberdade de pensamento e a tolerância religiosa.
- Spinoza acreditava que “Deus só existe filosoficamente” e que ele poderia ser identificado com as leis necessárias da natureza.
- A religião de Spinoza é a sua filosofia expressa na obra Ética e pode ser resumida pelo princípio Deus sive Natura (Deus, isto é, Natureza).
- Entre as principais obras de Baruch Spinoza destacamos a Ética e o Tratado teológico-político, publicados, respectivamente, em 1670 e 1677.
Quem foi Baruch Spinoza?
Baruch (Benedito ou Bento) Spinoza foi o filósofo que acreditava que Deus se revelava melhor na ordem constante da natureza do que nas palavras da Bíblia. Por isso mesmo, desautorizava o poder exercido por padres, rabinos e teólogos de qualquer ordem religiosa.
→ Infância e juventude de Baruch Spinoza
Ele nasceu a 24 de novembro de 1632, em Amsterdã, em uma família de judeus portugueses refugiados na Holanda. Naquela época, na cidade holandesa viviam muitas famílias israelitas provenientes, na sua maior parte, de reinos da Península Ibérica onde o judaísmo só poderia ser praticado na clandestinidade.
São chamados de sefarditas esses judeus que viviam em Amsterdã, muitos deles marranos, isto é, forçados a mostrarem-se cristãos (no Brasil foram chamados de cristãos-novos).
A comunidade judaica de Amsterdã era muito diversificada, pessoas que deixaram seu país de origem para professar livremente a sua fé, mas encontraram uma comunidade organizada por rabinos intransigentes que buscavam manter a estabilidade interna proibindo que a ortodoxia da tradição fosse questionada.
Spinoza cresceu nessa comunidade solidamente organizada, que falava predominantemente o espanhol, possuía uma sinagoga e escolas e obras de assistência, e foi educado na tradição rabínica, ensinado a ler a Torá em hebraico e iniciado no Talmud.

→ Excomunhão de Baruch Spinoza
A sua emancipação intelectual teve início quando aprendeu a ler em latim e um pouco de grego, o que lhe deu o aos filósofos cristãos da Idade Média, em particular São Tomás de Aquino, aos neoplatônicos do renascimento, e à filosofia e à ciência do seu tempo: Bacon, Hobbes, Descartes.
Baruch Spinoza, que recebera uma educação encerrada na tradição judaica, experimentou o latim como uma língua libertadora (o que ainda pode ser para todos que se sentem oprimidos por uma cultura de massa).
Os chefes da sinagoga, preocupados em manter a coesão da comunidade judaica e conservar intacta a fé na ortodoxia de Israel, começaram a se preocupar com o teor das conversas e ideias que Spinoza alimentava. As ideias de Spinoza entraram em conflito com as de seus antigos mestres.
Spinoza, acusado de ateísmo, não aceitou o acordo que lhe propunham, e a sentença de sua excomunhão foi pronunciada contra ele no dia 27 de julho de 1656:
“Pela decisão dos anjos e julgamento dos santos, excomungamos, expulsamos, execramos e maldizemos Baruch Spinoza... Ordenamos que ninguém mantenha com ele comunicação oral ou escrita, que ninguém lhe preste favor algum, que ninguém permaneça com ele sob o mesmo teto ou a menos de quatro jardas, que ninguém leia algo escrito ou transcrito por ele.”
Após ser excluído da comunidade judaica, Spinoza renunciou à herança paterna e transferiu para o irmão mais novo a futura istração dos negócios da família. Os irmãos e cunhados aproveitaram a excomunhão para deserdá-lo e afastá-lo dos rendimentos familiares.
Spinoza procurou aprender uma ocupação nova para obter sustento e ter tempo livre. Aprendeu a polir lentes de vidro para telescópios e microscópios. Naquela época, esse artesanato representava um setor de tecnologia de ponta, o que garantiu a Spinoza rendimento suficiente e algum tempo livre. Spinoza teve uma vida ativa e criou muitas relações com a sua época.
→ Morte de Baruch Spinoza
Spinoza era fisicamente muito fraco e sofreu com tuberculose durante quase vinte anos, provavelmente por respirar muita poeira de vidro quando fazia o polimento das lentes. Spinoza faleceu no domingo, 21 de fevereiro de 1677, após almoçar e não se sentir muito bem.
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Em que Spinoza acreditava?
Para entender no que Spinoza acreditava, devemos observar o contexto histórico em que viveu. A vida de Spinoza é marcada pelos anos finais da Guerra dos Oitenta Anos (1568-1648), que resultou na independência das sete Províncias Unidas dos Países Baixos.
Spinoza participou da construção do novo Estado holandês, fundado nas liberdades burguesas, ou seja, a liberdade de empresa e a liberdade de consciência, que levavam à valorização da tolerância religiosa e das atividades econômicas. As barreiras confessionais e os conflitos de ideias apresentavam-se como empecilhos para a realização do comércio, o que levou a burguesia a defender as liberdades e a tolerância.
Os holandeses uniram-se na resistência à autoridade dos reis da Espanha, que exploravam a população das províncias cobrando altos impostos. Na luta contra a Espanha católica, holandeses adotaram o protestantismo. A alta burguesia holandesa adotou o calvinismo liberal em oposição ao calvinismo ortodoxo adotado pelos monarcas da Casa de Orange.
Spinoza compartilhava as crenças dos calvinistas liberais, mais defensores das tolerâncias em matéria de religião, e afirmava a supremacia do poder civil sobre a autoridade religiosa.
Spinoza acreditava, portanto, que os teólogos não tinham direitos de legislar em assuntos de fé e de moral, como se soubessem o que é o bem viver e todos devessem seguir suas prescrições. Por outro lado, o calvinismo ortodoxo foi adotado pelas classes e camadas sociais mais prejudicadas com o desenvolvimento da economia mercante e com a nascente indústria: camponeses pobres, artesãos, marinheiros, trabalhadores dos portos e a nobreza, todos formando a monarquia holandesa da Casa de Orange-Nassau.
Dentro da Guerra dos Oitenta Anos (1548-1648), houve a Guerra dos Trinta Anos (1618-1648), um dos maiores conflitos da história europeia. O Sacro Império Romano-Germânico, liderado pelos Habsburgo, aliou-se à Espanha e à Baviera para combater os protestantes. Em reação, os principados protestantes receberam apoio das Províncias Unidas (futura Holanda).
Embora católica, a França esteve unida com as Províncias Unidas para contestar o poder dos Habsburgo. Como as duas guerras terminaram no mesmo ano, as Províncias Unidas am um tratado de paz em separado, o que abria as portas das colônias espanholas para o comércio holandês, satisfazendo assim os interesses da burguesia. A Casa de Orange, ao contrário, desejava a continuação da guerra, sem a qual sua existência perdia o sentido.
Após a paz, o poder ou a ser exercido pela burguesia e pela ala calvinista liberal, cujo maior representante era Johannes de Witt, eleito o governante em 1653, permanecendo até 1672, quando foi assassinado e a Casa de Orange retornou ao poder. Spinoza era amigo de Witt, de quem recebia proteções e garantias contra as perseguições que sofria, ele viveu intensamente todo conflito.
Spinoza acreditava na política de Witt e ficou horrorizado com o crime, o que considerou uma barbárie. Durante todo esse período, apesar da excomunhão de 1656, Spinoza escreveu a maior parte de suas obras e esteve integrado à vida cultural holandesa.
Os calvinistas liberais eram favoráveis ao cartesianismo, no qual Spinoza também acreditava. Spinoza tinha a maior parte dos seus amigos e leitores nesse grupo, o grupo dos colegiantes, integrantes do Collegi Prophetica. Os colegiantes dedicavam-se ao estudo da Bíblia e da nova filosofia, tendo sido eles os primeiros a lerem os manuscritos da Ética, redigida por Spinoza a partir de 1661.
Apesar da exclusão que marcou sua vida, Spinoza relacionava-se com muitas pessoas dos círculos culturais holandeses, sendo falsa a sua imagem como um solitário, eremita, pobre e asceta. Spinoza tinha relações com representantes expressivos das altas esferas istrativas e científicas da Holanda, recebia visitas em casa de Leibniz e dos irmãos Johannes e Cornelius de Witt, e compartilhava com eles muitas de suas crenças.
Teorias de Spinoza
As teorias de Spinoza podem ser encontradas nos seus principais livros, além de terem sido debatidas e comentadas na correspondência pessoal que o filósofo mantinha com intelectuais de toda Europa.
→ Deus, isto é, Natureza
A teoria de Spinoza sobre Deus identifica-o com as leis da natureza científicas fundamentais, que explicam todos os fenômenos que ocorrem na natureza. A concepção de Deus de Spinoza exclui qualquer possibilidade de milagres ou interferência divina na ordem das coisas.

Spinoza adota o método histórico-crítico para interpretação da Bíblia. Ele argumenta que temos de abordar as escrituras como o faríamos com qualquer outro texto, ou seja, sem pressupor como princípio de investigação que aquilo que o texto afirma é verdadeiro. Spinoza leu a Bíblia buscando conhecer a gramática, o vocabulário e as peculiaridades estilísticas da língua em que foi escrita, tarefa para a qual ele usou sua proficiência em hebraico, latim e um pouco de grego que aprendeu para ler o Novo Testamento.
Spinoza procurou conhecer as circunstâncias em que cada livro da Bíblia foi escrito, como nos foi transmitido, e como se tornou parte do cânone religioso. Desse modo, Spinoza concluiu que a Bíblia é uma obra de muitos autores humanos, que viveram muitos séculos depois dos acontecimentos que descreviam, apoiando-se em documentos que já se perderam. Portanto, o que nos foi transmitido são ideias muito diferentes e imperfeitas acerca de Deus.
Se os teólogos e os soberanos concordam com o uso fraudulento da Bíblia, então é porque eles encontram benefícios em manter a superstição e o dogmatismo que desviam a fé. Segundo Spinoza, a Bíblia é útil apenas nos seus ensinamentos morais mais fundamentais: a prática da justiça e do amor ao próximo como a nós mesmos. Nada mais importa.
No século XVII, nenhuma interpretação da Bíblia e sua religião foi mais arrojada do que a de Spinoza. Esse aspecto de sua filosofia exerceu forte influência nos filósofos iluministas do século XVIII.
→ Racionalismo radical
A filosofia de Spinoza é marcada pelo racionalismo absoluto, que consiste na crítica da superstição e do dogmatismo em todas as suas manifestações: religiosa, política e filosófica. Não existem milagres ou vontades divinas incompreensíveis para a razão humana.
Spinoza identifica a substância pensante com a substância extensa como formando uma unidade. Esse princípio torna possível interpretar a verdade de uma ideia com base na sua coerência com a racionalidade do sistema a que pertence, e não na sua correspondência com uma realidade externa.
A adesão de Spinoza à tradição racionalista está explícita no título de uma das suas primeiras obras: Os princípios da filosofia cartesiana demonstrados segundo o método geométrico, de 1663. Nela Spinoza demonstra dominar a filosofia de René Descartes, no qual se inspirou para usar a dedução e o método geométrico para demonstrar suas teses.
Porém, tanto os cartesianos quanto os racionalistas, como Leibniz, criticaram Spinoza não vendo nele um representante típico do racionalismo clássico. Só no contexto do século XIX, com a crise do racionalismo clássico e do projeto filosófico da modernidade, o pensamento de Spinoza será retomado como um racionalismo alternativo ao desenvolvimento da tradição moderna.
→ Corpo e mente
A teoria de Spinoza rejeita a separação entre corpo e alma conforme defendida por René Descartes. Em vez do dualismo psicofísico, Spinoza defende que a mente humana e o corpo são, respectivamente, modos do pensamento e da extensão, o que significa que são a mesma coisa, considerada ora sob o atributo do pensamento, ora sob o atributo da extensão.
Isso também significa que qualquer objeto físico, enquanto modo da extensão, tem de ser idêntico a algum modo do pensamento, então, tudo que tem espaço na extensão tem um espaço igual no pensamento. A mente morre com o corpo, portanto, não existe a imortalidade da alma — outra afirmação considerada heresia e que levou à excomunhão de Spinoza.
Esse tema da relação entre corpo e mente tem sido muito discutido pelos estudiosos de Spinoza. Na parte V da Ética, livro publicado postumamente, Spinoza afirma que há uma parte da mente que não é destruída com o corpo, mas sobrevive à sua morte.
→ As paixões e os desejos
A ética spinozista questiona as concepções tradicionais de “bem” e “mal”, de “vício” e de “virtude”. Partindo de uma análise da natureza humana, atravessada por desejos e paixões, Spinoza conclui que só podemos saber se uma coisa é boa ou má enquanto ela nos identificar ou nos afastar do conhecimento.
As paixões alegres ou positivas são aquelas que levam os pensamentos e as coisas a persistirem em ser o que são; ou seja, Spinoza identifica as paixões alegres com emoções, desejos e pensamentos que aumentam o poder de agir ou a persistência para a vida continuar. Spinoza usa o conceito de conatus para se referir a esse esforço, uma tendência dinâmica das coisas para se manter no seu próprio ser.
Sendo assim, Spinoza defende que nos é permissível fazer o que, segundo nosso julgamento racional, favorecerá nossa potência para agir e pensar. Mas o que nos favorece, Spinoza deixa bem explícito, é maximizar a nossa compreensão de Deus, isto é, da natureza.
As paixões tristes e negativas, ao contrário, nos afastam do conhecimento de Deus, isto é, das leis necessárias da natureza. Spinoza afirma que a superstição é uma paixão negativa. Ela nasceu de uma imaginação impotente para conhecer as leis necessárias do Universo. Sendo uma paixão triste, a superstição comanda a imaginação e a faz oscilar entre os medos e as esperanças. Então, as pessoas supersticiosas tornam-se manipuláveis pelo medo do mau e pela esperança do bem.
Essa concepção é projetada em um ser todo poderoso que existe fora do mundo e que controla o mundo segundo seus caprichos: Deus. A religião que nasce da superstição é negativa porque sugere que Deus é um ser colérico ao qual devemos prestar culto para recebermos benefícios em troca.
A teoria sobre as paixões e os desejos está no núcleo da Ética de Spinoza. Na realidade, o filósofo define o bem e o mau, o vício e a virtude em relação ao que é útil para a natureza humana por contribuir para a conservação do seu ser.
→ A liberdade e o Estado
Diante da natureza humana, Spinoza nega a existência de causas finais na realidade, o que o leva a redefinir o conceito de liberdade, não mais como livre-arbítrio, mas como consciência da necessidade.
Spinoza caracteriza o homem livre como aquele que, ao contemplar a substância infinita, reconhece a necessidade do curso natural das coisas; ou seja, em Spinoza a razão reconhece e aceita o determinismo, e a ação livre é aquela que está de acordo com a determinação das coisas.
O Tratado teológico-político, de 1670, é o livro em que Spinoza trata melhor do tema, revelando forte influência sofrida por Hobbes, mas chegando a conclusões diferentes. Diferentemente de Hobbes, Spinoza conclui que um governo tirânico com poder absoluto que oprime os seus súditos destrói necessariamente o seu próprio poder, e assim o seu direito, porque o poder do governo depende em última análise da cooperação voluntária dessas pessoas.
Espinosa conclui argumentando que, para se preservar a si próprio e ao seu poder, o governo tem de permitir uma liberdade ampla. Espinosa, portanto, defendia a democracia liberal como a forma de governo mais natural e estável.
Obras de Spinoza
- Tratado da reforma do intelecto (1661)
- Os princípios da filosofia cartesiana demonstrados segundo o método geométrico (1663)
- Tratado teológico-político (1665)
- Ética demonstrada pelo método geométrico (1677)
Teoria de Deus segundo Spinoza
→ Deus sive Natura
A teoria de Deus segundo Spinoza pode ser encontrada na Ética, obra na qual ele faz a apresentação mais sistemática e rigorosa das suas ideias e teorias. O livro I da Ética trata da natureza de Deus.
A teoria de Deus, segundo Spinoza, consiste em demonstrar que Deus existe e que age necessariamente, que é a causa de toda as coisas, que todas as coisas estão em Deus, sem o qual não poderiam existir nem ser concebidas, e que Deus predeterminou toda as coisas, não pela liberdade de sua vontade, mas pela absoluta necessidade de sua natureza.
A teoria de Deus segundo Spinoza nega o caráter pessoal de Deus, concebido sem intelecto, vontade, propósitos nem emoções, ou seja, sem as características que lhe foram atribuídas pelos homens.
A concepção impessoal de Deus segundo Spinoza provavelmente explica a razão por que foi excomungado e condenado pela comunidade judaica de Amsterdã: por defender um Deus que existe apenas filosoficamente, um Deus radicalmente diferente do adorado por Abraão, Isaac e Jacob nas escrituras.
Nos termos filosóficos de Spinoza, Deus é a substância, ou seja, o ser que é a causa de si, que existe em si e por si, que é concebido em si e por si. O Deus de Spinoza é autoprodutor, o que é diferente de ser a causa inicial de tudo e não causada por nada. A substância, Deus, é causa de si do mesmo modo que é causa das coisas. O ato pelo qual Deus se produz é o mesmo ato pelo qual produz toda a natureza. Deus é a causa de si, de todas as coisas e imanente à natureza.
Portanto, Deus é a criação autocriada, não o criador de uma natureza da qual se retirou para controlar o mundo segundo suas vontades. Deus não tem finalidades, porque senão seria imperfeito, as finalidades atribuídas a Deus são verdadeiros delírios para a imaginação dar formas humanas a Deus.

O Deus de Spinoza é constituído por infinitos atributos. Os atributos de Deus são infinitos em seu gênero e cada um deles exprime uma das qualidades infinitas da substância que é Deus. Desses atributos de Deus conhecemos apenas dois: extensão e pensamento. O pensamento e a extensão são atributos infinitos de Deus.
Com isso Spinoza afirma que Deus é matéria e não puro espírito. Além disso, a teoria de Deus segundo Spinoza aboliu o dualismo psicofísico cartesiano, pois pensamento e extensão são atributos de uma única substância.
O pensamento, sendo atributo de Deus, torna total inteligibilidade do real, não podendo haver nada que deixe de ser compreensível. Essa afirmação destrói a noção de milagre ou de vontade divina. Spinoza amplia até o extremo a identificação entre Deus e a natureza, identificando a vontade de Deus com a necessidade e a inteligibilidade das leis da natureza. Por isso a teoria de Deus segundo Spinoza pode ser resumida pela frase Deus sive Natura (Deus, isto é, Natureza).
Religião de Spinoza
A religião de Spinoza consiste no amor intelectual a Deus. Trata-se de uma terapia pela qual podemos esperar controlar nossas irracionalidades, escapar das paixões tristes, desde que seja cultivado o amor intelectual a Deus. Spinoza afirma que esse amor constitui o maior bem do homem. Ética, metafísica, religião, conhecimento e ação têm uma unidade na filosofia spinozista.
Frases de Spinoza
- “A mente esforça-se, tanto quanto pode, por imaginar aquelas coisas que aumentam ou estimulam a potência de agir do corpo.”
(Espinosa, Ética, III, prop. 12)
- “Cada homem engendrou, com base em sua própria inclinação, diferentes maneiras de prestar culto a Deus, para que Deus o considere mais que aos outros e governe toda a natureza em proveito de seu cego desejo e de sua insaciável cobiça. Esse preconceito transformou-se, assim, em superstição e criou profundas raízes em suas mentes, fazendo com que cada um dedicasse o máximo de esforço para compreender e explicar as causas finais de todas as coisas.”
(Espinosa, Ética, I, apêndice)
- “A que ponto o medo ensandece os homens! A causa da qual nasce a superstição, que a conserva e a alimenta, é pois o medo. […] Os homens são dominados pela superstição enquanto dura o temor; o culto vão ao qual se constrangem com respeito religioso se dirige a fantasmas, às desorientações da imaginação de uma alma triste e medrosa.”
(Espinosa, Tratado teológico-político, prefácio)
- “O Amor é a Alegria conjuntamente à ideia de causa externa.”
(Espinosa, Ética, III, Definições dos Afetos, 6)
- “Cada coisa esforça-se, tanto quanto está em si, por perseverar em seu ser.”
(Espinosa, Ética, III, prop. 6)
- “Se o grande segredo do regime monárquico e seu interesse maior é o de enganar os homens e colorir com o nome de religião o medo que lhes deve dominar, a fim de que combatam por sua servidão, como se se tratasse de sua salvação […]; bem ao contrário nada se pode conceber nem tentar de mais aborrecido em uma república livre.”
(Espinosa, Tratado teológico-político, prefácio)
- “Esforçamo-nos, nesta vida, sobretudo, para que o corpo de nossa infância se transforme, tanto quanto o permite a sua natureza e tanto quanto lhe seja conveniente, em um outro corpo, que seja capaz de muitas coisas e que esteja referido a uma mente que tenha extrema consciência de si mesma, de Deus e das coisas.”
(Espinosa, Ética, V, prop 39)
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Exercícios resolvidos sobre Baruch Spinoza
1. Sobre a questão da liberdade em Spinoza, a filósofa brasileira Marilena Chauí afirma o seguinte:
“[...] o poder teológico-político é duplamente violento. Em primeiro lugar, porque pretende roubar dos homens a origem de suas ações sociais e políticas, colocando-as como cumprimento a mandamentos transcendentes de uma vontade divina incompreensível ou secreta, fundamento da razão de Estado. Em segundo, porque as leis divinas reveladas, postas como leis políticas ou civis, impedem o exercício da liberdade, pois não regulam apenas usos e costumes, mas também a linguagem e o pensamento, procurando dominar não só os corpos, mas também os espíritos.”
CHAUÍ, Marilena. Espinosa, uma subversão filosófica. Revista CULT, 14 de março de 2010. Disponível em: https://revistacult.uol.com.br/home/baruch-espinosa/.
Segundo a citação acima, o poder teológico-político é violento, porque
- submete os homens a leis supostamente transcendentes ao negar-lhes a imanência de suas próprias ações.
- retira dos homens a esperança de que suas ações tenham como causa e fim a transcendência divina.
- transforma a linguagem e o pensamento dos homens em formas de libertação de corpos e espíritos.
- recusa aos usos e costumes o papel de fundamento transcendente das ações políticas e leis civis dos homens.
Resolução: A.
Segundo Marilena Chauí, o poder teológico-político é duplamente violento porque pretende submeter os homens a leis supostamente transcendentes, negando-lhes a imanência de suas próprias ações. Dessa forma, as ações humanas são vistas como cumprimento dos mandamentos divinos incompreensíveis, em vez de serem compreendidas como ações livres e imanentes aos próprios indivíduos.
Créditos da imagem
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Fontes
CHAUÍ, Marilena. Espinosa: uma filosofia da liberdade. São Paulo: Moderna, 1995.
MARCONDES, Danilo. Iniciação à história da filosofia. Rio de Janeiro: Zahar, 2007.
